Bravatas & Patriotadas

Em entrevista coletiva concedida logo após sua posse na presidência dos Estados Unidos, respondendo a um pergunta da repórter brasileira Raquel Krähenbühl, sobre as relações de seu governo com o Brasil e a América Latina, Donald Trump, depois de afirmar ironicamente que serão “ótimas”, saiu-se com esta: “Eles precisam de nós, nós não precisamos deles” (https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2025/01/nos-nao-precisamos-deles-diz-trump-sobre-brasil-e-america-latina.shtml) . É como se dissesse: “Valem, nessa relação, os nossos interesses e não os deles, porque eles de nós dependem.”.

O “eles”, usado na resposta, faz supor que Trump, diante da correta pronúncia americana da jovem, mas experiente, jornalista da Globo News, radicada em Washington, nem percebeu que falava com uma latino-americana. Mas, ao mesmo tempo, revela o desprezo a seus povos vizinhos e a soberba gigantesca daquele político ianque, entranhada na cultura de grande parte de seus patrícios. Cultura, aliás, que ele tem alimentado, contra todas as tendências de multilateralismo e de solidariedade entre os povos, necessárias para a inadiável paz de que se ressente o Planeta.

ORGULHO E EGOÍSMO

Ouvindo a resposta de Trump, logo me veio à mente o ditado popular segundo o qual “ninguém é tão pobre que não tenha nada a dar, nem tão rico que de nada necessite”. Mas também lembrei que todos os grandes impérios, sustentados, por algum tempo, por lideranças soberbas, colonialistas e poderosas, todos eles acabaram por ruir e necessitaram da cooperação de outros povos, de outras culturas e de outras formas de encarar os mecanismos da vida, para se reabilitarem.

Se, como afirmou Allan Kardec, falando sobre a evolução do ser humano, o orgulho e o egoísmo geram todos os demais vícios impeditivos do progresso, isso vale também para os povos. Mesmo que a capacidade intelectual humana, geradora do progresso material e também indutora ao orgulho e ao egoísmo, não seja acompanhada, de imediato, pelo progresso moral, “esse estado de coisas durará apenas algum tempo; mudará à medida que o homem compreender melhor que, além dos gozos dos bens terrenos, existe uma felicidade infinitamente maior e mais duradoura.” (questão 785, L.E.).

O 3º milênio de nossa era alcançou-nos com um alto grau de convencimento teórico sobre necessidades mundiais de cooperação entre os povos em prol de agendas capazes de gerar benefícios globais que se fazem inadiáveis. Dentre essas conquistas teóricas despontam a saúde pública de todos os habitantes da Terra e a proteção ao meio-ambiente. Trump, exibindo ímpar arrogância, já no dia de sua posse, anunciou a retirada dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde e do Acordo Climático de Paris, vigorosas expressões concretas em prol dessas agendas mundiais. É como se repetisse: “Nós não precisamos deles, eles precisam de nós”.

A NOVA ERA

Para além dessas atitudes, o novo presidente norte-americano bateu de frente contra o acolhimento de imigrantes. Anunciou a deportação de milhões deles, negando também cidadania americana a filhos de imigrantes lá nascidos, o que reabilita o ultrapassado conceito do “jus sanguinis” (direito à cidadania por força do sangue). Esquecido de que a grandeza de seu país foi construída por imigrantes vindos dos quatro cantos da Terra, manifestou a falsa ideia de que o alto índice de criminalidade violenta de seu país deve-se a estrangeiros, quando, ao contrário, é fruto da política armamentista e violenta lá historicamente sustentada por políticas estatais. Declarou, também, guerra às políticas civilizatórias de igualdade de gênero: “Daqui para frente, na América, só haverá dois gêneros: o masculino e o feminino”, disse.

A isso tudo, Trump denomina o advento de uma “nova era” a marcar a história de seu grande país. Nação alguma se sustenta sobre bases racistas, homofóbicas, xenofóbicas e antiambientalistas. Essas agendas foram construídas com muita luta pela sociedade moderna e contemporânea. A nova era que a sociedade progressista quer exige justamente a derrubada desses entraves. E é pra já!

E ASSIM VAMOS

Os paradigmas éticos aceitos pela filosofia espírita estão inteiramente de acordo com essas agendas que comprovam, sim, o progresso da humanidade. Ele se dá, apesar da existência, ainda, de lideranças mundiais que o entravam. O êxito político dessas lideranças resulta da ignorância, ainda persistente no mundo, acerca do verdadeiro sentido da vida, tão bem apreendido por quem admite a imortalidade do espírito e sua vocação progressista, independentemente de ideologias políticas ou crenças religiosas. Trata-se é uma construção fundamentalmente laica, humanista e racional, frequentemente, obstaculizada pela religião, mancomunada com as hipócritas e cruéis forças políticas.

Minha crença na humanidade não decresce com essas situações provisórias e pedagógicas. Neste meu entardecer da vida, aos 84 anos, tenho, preferentemente, manifestado minhas ideias por meio de quadrinhas. Como exercício mental e desenvolvimento da capacidade de síntese sobre os grandes temas da atualidade, busco compor uma trova por dia, publicando-a em minha página de Facebook. Retratando o difícil momento que atravessamos, dia desses, com a eleição de Trump, a exemplo de tantos outros falastrões, que se dizem “enviados de Deus”, publiquei esta: “Flui o terceiro milênio / E a humanidade insensata / Dá o poder como prêmio / A quem adora bravata.”.

É o momento que vivemos. Até quando? Não sei. Mas, um dia acaba. Nem que seja à custa de muito sofrimento.

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